Dividindo Emoções

São quase 23 anos de exercício de magistério estadual e alguns anos de municípios que somados ultrapassam mais de 30 anos de sala de aula.
Eu vi tantas histórias de colegas,pais,alunos...algumas tristes,outras alegres,engraçadas como cenas de comédia e muitas acrescidas de emoções que daria não só um livro,vários. Eu sempre me vi sei lá a razão(talvez diria é uma missão ou talvez resgate ou quem sabe aprovações),não importa como definiria isso.Mas o fato que sempre soube lidar com as situações de sala de aula sem que me envolvesse emocionalmente por vários dias seguidos,revolvendo ou não as situações eu como dizem as crianças deletava.Não foi assim dessa vez eu estou há dois dias com um nó na garganta e cada vez que eu recordo a cena me vem as lágrimas e uma sensação de impotência total.Temos alunos que chamamos de indisciplinados,mal educados,sem limites,hiper-ativos e sei mais o que...dentro de nossa sala de aula,alguns a gente ama ,outros nem tanto.E temos aqueles meiguinhos que não falam ficam ali nos olhando com um olhar pidão de carinho,de tempo para eles,pois estamos ocupadas de mais com os danados e muito pouco sobra para eles.E foi com uma falha no olhar de bicho "coruja "que passou aquele serzinho,que fica ali bem na minha frente ,olhos grandes e verdes de uma doçura imensa,eu não percebi seu grito de socorro dentro do seu imenso silêncio.Não vou esquecer da cena que vou contar para vocês.Chega a mãe com a menina pelo braço pedindo para falar comigo.Pensei que fosse a solicitação das notas,pois na sexta havia entregue as notas.Eu olhei para ela e disse que a menina estava bem e que pegasse suas notas na secretária.Me respondeu que precisava falar comigo.

Coloquei os outros para dentro e voltei para ver então o que queria.Continuava a segurar o braço da menina que me olhava calada.Foi ai que me disse:

_Professora minha filha colou na prova e eu quero que anule as notas dela e dê zero,pois eu sei todas essas matérias que está ensinando e garanto para a senhora que ela não sabe.Fiquei surpresa não com o fato da cola,mas da atitude descontolada da mãe que continuava a apertar a menina.Tentei argumentar dizendo que toda criança cola,não por maldade e sim por sua inocência e que todos na sala sabiam que não era correto tal atitude.que Num gesto agressivo obrigou a filha a confessar que havia feito a tal cola, eu olhei para um lado vi outra mãe que assistia tudo calada e balançava a cabeça.

Mais uma vez tentei argumentar e foi nesse momento que eu pela primeira vez senti um nó terrível e senti meus olhos se encherem de lágrimas ao ouvir a mãe dizer que a filha falsa,mentirosa,dissimulada e outras coisas.Puxei a menina e mandei que entrasse para não continuar ouvindo o que continuou a dizer sem dó.Pedi que se acalmasse e controlei minha emoção, falei da filha linda que tinha,do esforço que faz para aprender e muito mais.Me disse vou embora,porque tu não sabe quem é essa dai outro dia falamos.Saiu e eu permaneci imóvel calada sem saber o que dizer ou fazer ,voltei aterrizar quando a outra mãe me disse:

_Professora louvável sua atitude de retirar de perto dela a menina para não ouvir tamanhos absurdos.E eu que pensei que já havia visto ou ouvido tudo nessa vida.Tenho que dizer para ela mesmo que não me ouça "eu "também não.Voltei para a sala e ela me olhou sem dizer uma palavra.Eu me abaxei perto dela e segurei sua mão e disse que podia contar comigo.Foi só o que fiz,pois não tinha mais condições de dizer qualquer coisa.Hoje voltou a sala e chorou quando alguém se aproximava dela.Tentei saber algo,mas se negou falar e não insisti,apenas fiz saber que eu estarei ali se precisar.O que quero dizer é que as vezes prestamos mais atenção naqueles que nos deixam de cabelos brancos e esquecemos aqueles que não nos dão trabalho algum.Quem sabe quantos desses não tinham ou passavam por alguma situação e nós não enxergamos.Ai lembrei de uma mensagem que recebi um dia que dizia"Olha para mim professora".